Parabéns úmidos, meu Rio!
Por: Cristina Vergnano
Em 1 de março de 1565, entre os morros Cara de Cão e Pão de Açúcar, Estácio de Sá fundou a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Ou seja, hoje, nossa Cidade Maravilhosa completa 455 anos.
Estranhei a falta de comentários a respeito… É bem verdade que eu não vi televisão, nem ouvi rádio hoje. Então não poderia, de fato, queixar-me da ausência de notícias sobre a data (nem sei se alguém os fez…). Mas também não vi qualquer postagem a respeito no WhatsApp ou no Twitter. Por que seria?!?
Nossa cidade tem sido alvo de muitos problemas, de descaso e crises. Não há, suponho, muita razão para o povo comemorar… Então, se deduz daí que não haveria motivos para se lembrar deste dia. Mas o silêncio pode, simplesmente, ser efeito do feriado comemorativo que cai no dia do padroeiro: São Sebastião. Ou seja, em 20 de janeiro, e não na data da fundação. Isso costuma causar confusão. Pode ser, também, resultado de um sucateamento educacional, que gera o desconhecimento (e, por que não dizer?, desinteresse) das datas cívicas.
Aliás, o próprio adjetivo “cívico” está fora de moda. Pode ser um ressentimento pelo valor semântico carregado de aspectos ideológicos de índole ditatorial, em uso durante o regime militar (nem questiono isso). O fato, no entanto, é que o civismo não deveria ser tão malvisto. Embora o termo tenha valor polissêmico (incluídos esses de caráter ideologicamente mais negativo), está, em sua raiz, ligado a “cidadania”. Portanto, tem relação com o interesse público, os direitos do cidadão ou da cidade, o cuidado com a pátria, as pessoas e nosso espaço. Nestes últimos sentidos, somos corresponsáveis pelo que nos ocorre ao não cobrarmos das autoridades, ao não fazermos a nossa parte, ao não exigirmos nossas aspirações coletivas por um voto consciente.
Não quero, entendam bem, atirar pedras nas vítimas do descaso que impera aqui no Rio. Nada disso! Sei bem que nem sempre conseguimos realizar atos concretos em favor da coletividade. Aliás, onde faltam educação e saúde, fica difícil reagir. Apenas constato que nem sempre, tampouco, assumimos nosso papel em favor do bem comum. E isso, mesmo quando podemos fazê-lo, ainda que em pequeníssima escala.
Seja como for… hoje é aniversário do Rio de Janeiro. Ele tem problemas enormes, sim, mas também continua, numa tremenda contradição, lindo! Lindo nas pessoas que lutam, no trabalho, nas suas comunidades, nas suas famílias, por um dia a dia e um amanhã melhores. Lindo nas artes que aqui brotam, mesmo em meio às adversidades. Lindo na natureza, muitas vezes tão castigada, que, ainda assim, se renova, recupera e insiste em brilhar.
Vivemos entre o mar e a montanha. Entre o concreto e as matas. Com rios, lagoas, mar. Compartilhando o cotidiano, ricos e pobres, marginalizados ou não. Hoje, comemoramos um pouco mais de 4 séculos e meio, com muita água… Uma chuva contínua que não deixou de trazer os transtornos das águas de março, resultado da falta de manutenção urbana, mas, igualmente, da transformação desordenada que imprimimos à natureza e ao espaço que habitamos. Afinal, aterramos lagoas e pântanos, mudamos cursos de rios e contornos do litoral, cobrimos de pedra e asfalto a terra porosa que antes absorvia as torrentes, plantamos infindáveis construções de concreto e tijolos no lugar das árvores. Isso não poderia ficar impune, não é?!?
Nossa cidade nasceu da necessidade de os portugueses protegerem seu território conquistado das invasões de franceses. Primeiro teve seu marco implantado entre os morros Cara de Cão e Pão de Açúcar, como eu já disse, para depois ser transladada para o Morro do Castelo e, daí, expandir-se, alongada, espremida entre o litoral e as cadeias montanhosas, de leste a oeste. Todo mundo a conhece apenas por Rio. Tem, contudo, um nome bem mais longo e fruto, em parte, de um equívoco. O “São Sebastião”, recebeu em homenagem ao então rei de Portugal, Dom Sebastião. O “Rio de Janeiro”, por pensarem os conquistadores que a baía de Guanabara era a foz de um grande rio, ao qual chegaram em janeiro de 1502. Aí está o equívoco.
Equivocada ou não, dilapidada ou menosprezada, ocupada indiscriminadamente, não importa!… Esta é a nossa cidade. Podemos até estar decepcionados, frustrados e cansados da vida atribulada e tensa que viemos aqui… é, porém, nosso berço, “cheia de encantos mil” e contradições. E eu, em nome e outras e outros cariocas (nativos ou adotivos), que reconhecemos suas limitações, mas guardamos por você um carinho “da gema”, quero desejar-lhe (e a todos e todas nós) um feliz aniversário! Que seu presente possa ser a melhora progressiva das condições de vida que compartilhamos!
Para você, Rio, aquele abraço!!!!
Beijo do coração!!!