Opinião

Concisão e densidade: apresentando os microcontos

Por: Cristina Vergnano

Recentemente, participei de um concurso de microcontos. Achei a experiência tão interessante, que decidi inserir uma nova seção aqui no ToV, dedicada aos micro/minicontos. Mas, do que se trata exatamente?

Os contos, de modo geral, devem narrar uma história breve, marcada por um único conflito. Esta é a característica mais importante e que define o gênero literário. Há, porém, outras que podem somar-se a ela: poucos personagens, espaço e recorte temporal limitados.

A partir do século XX, vem-se tornando popular uma subcategoria desse gênero: o microconto. De certa forma, para defini-lo, o nome já fala por si. Às características canônicas do conto, acrescenta-se o fato de essas serem narrativas de ficção marcadas pelo reduzido número de caracteres. Ou seja, em poucas frases (ou menos ainda, uma única), o autor deve contemplar toda a estrutura do gênero. Se quiséssemos resumir a questão, eu diria que ele congrega concisão e densidade. No primeiro caso, pela óbvia redução nas dimensões do texto.  No segundo, pela riqueza de informação concentrada, muitas vezes sugerida, que deixa essa produção literária densa e convida o leitor a preencher as lacunas.

Buscando na internet, encontramos três terminologias relacionadas ao tema: microconto, miniconto e nanoconto. Alguns os tratam como sinônimos. Há, contudo, quem os diferencie não só pelo tamanho, mas, também, por conteúdos. Assim, defendem que, em termos de tamanho, a gradação decrescente seria: miniconto, nanoconto e, por fim, o menor, microconto. Enquanto no primeiro teríamos o minimalismo, mas com ação, personagem e cenário, no segundo brevidade e concisão envolveriam uma só ação e um só conflito. No caso do último, apenas achei enfatizado o fato de ter dimensões diminutas, uma frase, por exemplo.

A busca pelo sintético não é, eu diria, um fenômeno de hoje. Sempre me lembro do autor espanhol Ramón Gómez de la Serna, criador das “greguerías”. No seu caso, ele não propôs narrações, mas composições filosóficas, poéticas e humorísticas em prosa, extremamente breves. Para o próprio autor, que as lançou por volta de 1912, se tratava de um conjunto de metáfora e humorismo que ousava definir o que não pode ser definido, capturar o passageiro.

Na era digital e das redes sociais nas quais estamos inseridos, a criação do Twitter (entendido como miniblog) teria sido um incentivo à escrita literária marcada pela concisão. Ainda assim, data de bem antes do surgimento do Twitter (criado em 2006) a autoria do primeiro microconto: El dinosaurio. Seu autor foi o escritor hondurenho, naturalizado guatemalteco, Augusto Monterroso (1921-2003). O texto, de 1959, é: “Cuando despertó, el dinosaurio todavía estaba allí.

Considerando a origem hispânica de Monterroso, talvez seja possível estabelecer algum tipo de ponte entre ele e Gómez de la Serna. Mas, mesmo que não exista, não podemos negar que em nossos dias, pela velocidade dos acontecimentos, o volume de informações, a interação e a multimodalidade, somos convidados ao rápido, ao breve. Essa tendência não é nova, pois os eventos da industrialização, da mecanização e da comunicação por rádio, telefone e televisão já induziam à rapidez e economia de espaço. A cultura digital, contudo, parece potencializar tal realidade. Mesmo o espaço não sendo um problema, como já o foi nos tempos pré-imprensa, o tempo, sim, o é, cada vez mais.

A arte é sensível às mudanças na humanidade, muitas vezes antecipando-as. Talvez seja esta a chave para explicar o fenômeno dos microcontos. Seja como for, esse subgênero literário surge com interesse crescente e é um desafio aos autores que precisam comunicar, sensibilizar e provocar efeitos com uma abordagem minimalista.

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